Saiba quais são os critérios que a escola deve considerar na hora de comprar brinquedos, considerados materiais didáticos na educação infantil
Julia Contier
Na educação infantil, brinquedos são coisa séria. Finalmente vistos como materiais pedagógicos, hoje se entende que eles são possibilidades de vivências de desenvolvimento e de aprendizado – e, portanto, devem ser bem escolhidos e empregados. Mas a aquisição desse material tão valioso ainda não está consolidada no âmbito do sistema educacional e levanta muitas dúvidas para os gestores da educação, sejam eles da rede pública ou privada.
Entre as instituições públicas, a questão finalmente começa a ganhar a importância que merece. Em 2012, o Ministério da Educação lançou o primeiro Pregão Eletrônico de Registro de Preços para Aquisição de Brinquedos pelos Estados, Municípios e Distrito Federal. Com esta iniciativa, o MEC analisou, selecionou e submeteu a testes de qualidade uma listagem de brinquedos adequados à faixa etária de zero a cinco anos.
O órgão realizou audiências públicas envolvendo fabricantes, educadores e gestores para atender às necessidades das diversas áreas e fazer um levantamento de sugestões. Posteriormente a esta etapa, negociou em processo licitatório nacional o preço e entrega das eventuais compras, subsidiando e facilitando a aquisição por parte de prefeituras que muitas vezes têm dificuldades de gerenciar esse complexo processo.
Novas competências
De acordo com as regras, a compra deve ser feita com recursos próprios ou de outras fontes, mas as secretarias de Educação têm autonomia para decidir quais brinquedos e em qual quantidade os desejam, de acordo com a sua proposta pedagógica e a demanda de seus estabelecimentos. Para ter acesso à lista, é necessário fazer a adesão on-line (veja endereço na página 61).
A realização dessa primeira licitação nacional introduz competências novas no âmbito do governo federal e é vista como uma grande vitória da educação infantil, acredita Adriana Freyberger, coautora do manual Brinquedos e brincadeiras de creches. “Antes não fazia parte das atribuições das instituições de ensino comprar brinquedos, pois eles não eram entendidos como material didático, considerados nessa categoria até então apenas berço, cadeira, mesa etc. Quem quisesse fazer uma boa ação doava um brinquedo para uma creche. Na prática, elas eram quase um depósito de lixo reciclado. Por isso, vejo [o pregão do MEC] como um enorme ganho para as creches”, comemora Adriana.
Mas além de adquirir os produtos licitados pelo MEC, Adriana se preocupa com o bom uso dos brinquedos em cada realidade. “A escola vai receber um kit muito básico, mas também um material com orientações para complementar a compra, de acordo com a região e cultura em que se encontra”, afirma. Ela explica, por exemplo, que ao receber o kit com dez bonecas da licitação, a escola pode incluir algumas bonecas negras e índias, de acordo com o contexto local.
Questões pedagógicas
Mesmo em colégios particulares, as questões pedagógicas devem ficar sempre a cargo do professor e coordenador, que são os profissionais mais indicados para a tarefa, recomenda Marta Giardini, presidente da Associação Brasileira de Brinquedos Educativos (Abrine). Algo que, na prática, nem sempre acontece.
“Quem compra os produtos não conhece os brinquedos que vai comprar. O professor pede um dominó folclórico, mas o financeiro não se convence de que deve pagar mais por esse produto”, afirma Marta, que defende que a qualidade é mais importante do que o preço. “É importante respeitar o conhecimento dos coordenadores e professores; eles têm discernimento para resolver o que querem dentro da sala de aula. O financeiro deve acompanhar a decisão, mas não frisar sempre o menor preço”, sugere.
Para a escola, a participação do professor em todo o processo é fundamental para não se perder o investimento em um produto que ficará sem uso. “O primeiro critério para a compra é o professor conhecer o produto e ter um planejamento para ele, de que forma esse material será utilizado. Às vezes os professores não estão preparados para usar um material escolhido à revelia. É preciso que ele saiba de que forma é possível trabalhar com o brinquedo”, afirma a presidente da Abrine.
Escolha certa
O brinquedo tem o potencial de promover nas crianças pequenas aprendizagens dos mais variados aspectos da vida, por isso eles são peças fundamentais nas escolas de educação infantil. “O brinquedo não é apenas educativo do ponto de vista de ensinar um conteúdo. Ele também favorece o desenvolvimento da criança do ponto de vista motor, afetivo, psicológico, intelectual e social”, defende Maria Ângela Barbato Carneiro, coordenadora do Núcleo de Cultura e Pesquisas do Brincar da Faculdade de Educação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).
Portanto, o responsável pela compra deve estar atento a que tipo de brinquedo é mais indicado a cada faixa de desenvolvimento, de acordo com as idades. Segundo Maria Ângela, para as crianças menores, de 4 meses a 3 anos, as melhores opções são os que desenvolvam os movimentos, façam-nas se exercitarem, como bolas, triciclos, carrinhos e bichos com rodas que elas possam puxar ou empurrar, brinquedos de encaixar, que elas possam colocar uns dentro dos outros. “Elas gostam muito da arca de Noé, porque tem todos os bichos, o Noé e a barca”, exemplifica.
Para os maiores, de 3 a 6 anos, a ênfase deve mudar para brinquedos que ajudem nas representações do faz de conta, como fantasias e cenários. “Os jogos com regras devem aparecer a partir dos 5 anos”, aconselha a professora da PUC.
Independentemente da idade, um “bom brinquedo” é o brinquedo usado pelas crianças. Em geral, os preferidos costumam ter uma característica: eles podem ser transformados pela imaginação. “Brinquedo que brinca sozinho é melhor nem comprar, porque a criança os descarta na primeira vez de uso. Ela brinca três, quatro minutos e depois que descobre a funcionalidade do brinquedo não quer mais. Quanto mais potencial o brinquedo tem para ser “modificado” pela criança, melhor para o desenvolvimento”, diz Maria Ângela.
Brinquedos que tenham como característica principal o uso de tecnologia, no entanto, devem ser escolhidos com critério. “Não sugiro que ignorem os brinquedos que propiciam a tecnologia, mas não é preciso comprar brinquedos sofisticados demais, é recomendável evitar o consumo porque é ‘moda’”, aconselha a especialista.
A resistência é outro quesito essencial para garantir um mínimo de durabilidade aos brinquedos de uso coletivo. No ambiente escolar, eles são manuseados constantemente, por várias crianças ao mesmo tempo e várias turmas em diferentes períodos do dia. “O brinquedo da escola não é o mesmo brinquedo de casa. Do ponto de vista conceitual ele pode ser o mesmo, mas a manuseabilidade e a forma de ser armazenado no dia seguinte são diferentes. Temos de tratar o ambiente escolar de outra maneira”, afirma Synesio Batista da Costa, presidente da Associação Brasileira de Fabricantes de Brinquedos (Abrinq).
Synesio reconhece, no entanto, que a indústria nacional ainda está se adaptando a esse cenário. “Essa é uma cultura nova, mas entendemos ser um mercado muito promissor. Por isso as indústrias estão se equipando, procurando novos designs”, diz.
Segundo o presidente da Abrinq, o mercado de brinquedos no Brasil movimentou R$ 7 bilhões em 2012, mas as vendas para o ambiente escolar representaram apenas 0,8% do total. Em 2013, o mercado cresceu para R$ 8,5 bilhões e as vendas para a escola já representaram cerca de 1%. A expectativa, diz ele, é que esse nicho chegue a 5% dentro de um período de três a cinco anos, um crescimento “bastante significativo”, considera.
Entre as instituições públicas, a questão finalmente começa a ganhar a importância que merece. Em 2012, o Ministério da Educação lançou o primeiro Pregão Eletrônico de Registro de Preços para Aquisição de Brinquedos pelos Estados, Municípios e Distrito Federal. Com esta iniciativa, o MEC analisou, selecionou e submeteu a testes de qualidade uma listagem de brinquedos adequados à faixa etária de zero a cinco anos.
O órgão realizou audiências públicas envolvendo fabricantes, educadores e gestores para atender às necessidades das diversas áreas e fazer um levantamento de sugestões. Posteriormente a esta etapa, negociou em processo licitatório nacional o preço e entrega das eventuais compras, subsidiando e facilitando a aquisição por parte de prefeituras que muitas vezes têm dificuldades de gerenciar esse complexo processo.
Novas competências
De acordo com as regras, a compra deve ser feita com recursos próprios ou de outras fontes, mas as secretarias de Educação têm autonomia para decidir quais brinquedos e em qual quantidade os desejam, de acordo com a sua proposta pedagógica e a demanda de seus estabelecimentos. Para ter acesso à lista, é necessário fazer a adesão on-line (veja endereço na página 61).
A realização dessa primeira licitação nacional introduz competências novas no âmbito do governo federal e é vista como uma grande vitória da educação infantil, acredita Adriana Freyberger, coautora do manual Brinquedos e brincadeiras de creches. “Antes não fazia parte das atribuições das instituições de ensino comprar brinquedos, pois eles não eram entendidos como material didático, considerados nessa categoria até então apenas berço, cadeira, mesa etc. Quem quisesse fazer uma boa ação doava um brinquedo para uma creche. Na prática, elas eram quase um depósito de lixo reciclado. Por isso, vejo [o pregão do MEC] como um enorme ganho para as creches”, comemora Adriana.
Mas além de adquirir os produtos licitados pelo MEC, Adriana se preocupa com o bom uso dos brinquedos em cada realidade. “A escola vai receber um kit muito básico, mas também um material com orientações para complementar a compra, de acordo com a região e cultura em que se encontra”, afirma. Ela explica, por exemplo, que ao receber o kit com dez bonecas da licitação, a escola pode incluir algumas bonecas negras e índias, de acordo com o contexto local.
Questões pedagógicas
Mesmo em colégios particulares, as questões pedagógicas devem ficar sempre a cargo do professor e coordenador, que são os profissionais mais indicados para a tarefa, recomenda Marta Giardini, presidente da Associação Brasileira de Brinquedos Educativos (Abrine). Algo que, na prática, nem sempre acontece.
“Quem compra os produtos não conhece os brinquedos que vai comprar. O professor pede um dominó folclórico, mas o financeiro não se convence de que deve pagar mais por esse produto”, afirma Marta, que defende que a qualidade é mais importante do que o preço. “É importante respeitar o conhecimento dos coordenadores e professores; eles têm discernimento para resolver o que querem dentro da sala de aula. O financeiro deve acompanhar a decisão, mas não frisar sempre o menor preço”, sugere.
Para a escola, a participação do professor em todo o processo é fundamental para não se perder o investimento em um produto que ficará sem uso. “O primeiro critério para a compra é o professor conhecer o produto e ter um planejamento para ele, de que forma esse material será utilizado. Às vezes os professores não estão preparados para usar um material escolhido à revelia. É preciso que ele saiba de que forma é possível trabalhar com o brinquedo”, afirma a presidente da Abrine.
Escolha certa
O brinquedo tem o potencial de promover nas crianças pequenas aprendizagens dos mais variados aspectos da vida, por isso eles são peças fundamentais nas escolas de educação infantil. “O brinquedo não é apenas educativo do ponto de vista de ensinar um conteúdo. Ele também favorece o desenvolvimento da criança do ponto de vista motor, afetivo, psicológico, intelectual e social”, defende Maria Ângela Barbato Carneiro, coordenadora do Núcleo de Cultura e Pesquisas do Brincar da Faculdade de Educação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).
Portanto, o responsável pela compra deve estar atento a que tipo de brinquedo é mais indicado a cada faixa de desenvolvimento, de acordo com as idades. Segundo Maria Ângela, para as crianças menores, de 4 meses a 3 anos, as melhores opções são os que desenvolvam os movimentos, façam-nas se exercitarem, como bolas, triciclos, carrinhos e bichos com rodas que elas possam puxar ou empurrar, brinquedos de encaixar, que elas possam colocar uns dentro dos outros. “Elas gostam muito da arca de Noé, porque tem todos os bichos, o Noé e a barca”, exemplifica.
Para os maiores, de 3 a 6 anos, a ênfase deve mudar para brinquedos que ajudem nas representações do faz de conta, como fantasias e cenários. “Os jogos com regras devem aparecer a partir dos 5 anos”, aconselha a professora da PUC.
Independentemente da idade, um “bom brinquedo” é o brinquedo usado pelas crianças. Em geral, os preferidos costumam ter uma característica: eles podem ser transformados pela imaginação. “Brinquedo que brinca sozinho é melhor nem comprar, porque a criança os descarta na primeira vez de uso. Ela brinca três, quatro minutos e depois que descobre a funcionalidade do brinquedo não quer mais. Quanto mais potencial o brinquedo tem para ser “modificado” pela criança, melhor para o desenvolvimento”, diz Maria Ângela.
Brinquedos que tenham como característica principal o uso de tecnologia, no entanto, devem ser escolhidos com critério. “Não sugiro que ignorem os brinquedos que propiciam a tecnologia, mas não é preciso comprar brinquedos sofisticados demais, é recomendável evitar o consumo porque é ‘moda’”, aconselha a especialista.
A resistência é outro quesito essencial para garantir um mínimo de durabilidade aos brinquedos de uso coletivo. No ambiente escolar, eles são manuseados constantemente, por várias crianças ao mesmo tempo e várias turmas em diferentes períodos do dia. “O brinquedo da escola não é o mesmo brinquedo de casa. Do ponto de vista conceitual ele pode ser o mesmo, mas a manuseabilidade e a forma de ser armazenado no dia seguinte são diferentes. Temos de tratar o ambiente escolar de outra maneira”, afirma Synesio Batista da Costa, presidente da Associação Brasileira de Fabricantes de Brinquedos (Abrinq).
Synesio reconhece, no entanto, que a indústria nacional ainda está se adaptando a esse cenário. “Essa é uma cultura nova, mas entendemos ser um mercado muito promissor. Por isso as indústrias estão se equipando, procurando novos designs”, diz.
Segundo o presidente da Abrinq, o mercado de brinquedos no Brasil movimentou R$ 7 bilhões em 2012, mas as vendas para o ambiente escolar representaram apenas 0,8% do total. Em 2013, o mercado cresceu para R$ 8,5 bilhões e as vendas para a escola já representaram cerca de 1%. A expectativa, diz ele, é que esse nicho chegue a 5% dentro de um período de três a cinco anos, um crescimento “bastante significativo”, considera.
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